Sobre o ressentimento (uma visão não moralizante)
O ressentimento é um afeto que repete.
Se trata mesmo de um re-sentir.
Sentir de novo e de novo e de novo.
Especificando melhor, tem a ver com um certo apego.
Apego a algo que nos toca de modo angustiante.
De modo bastante hostil, até.
O ressentimento é aquele afeto que permanece.
E ele é em relação ao outro.
É uma fixação em memórias, momentos em que um outro nos atravessou.
No ressentimento, costumeiramente, o outro aparece como completo:
ele tinha o poder e ele fez algo com isso que me atravessou violentamente.
É comum o ressentimento se relacionar com um sentimento de injustiça.
Esse afeto é tão intenso que, em algumas religiões, vemos a noção de perdão bastante enraizada - como uma forma de lidar com o ressentimento.
Como se fosse possível esquecer, de alguma forma.
Ou se desafetar.
Na psicanálise, não falamos em perdão.
Podemos pensar, sim, que talvez alivie alguma coisa saber que o ressentimento consome - e consome de quem sente, não do outro.
Demanda muita energia para re-sentir.
E, na verdade, o re-sentir pode ser bastante impotente.
Talvez quando falamos em ressentimento, possamos falar sobre o luto de uma dor.
Não se ressente à toa.
Talvez assim, seja possível contornar um afeto que não cessa de se inscrever.
Morgana M Medeiros
CRP 06/140543